domingo, 21 de junho de 2009

«(...) - Diz-me, terra-mãe, diz-me a verdade: não poderão os homens viver sem guerras? - Fazes perguntas difíceis, Tolgonai. As chamas da guerra devoraram povos inteiros; cidades pereceram em incêndios; séculos houve em que eu sonhei ver pelo menos uma peugada de homem. A cada nova guerra, dizia eu aos homens: “Alto! Não derrameis mais sangue!” E hoje também digo: “Vós, que viveis além dos montes e dos mares! Vós, que viveis neste mundo! Que quereis? Terra? Tendes-me aqui, sou eu a terra! Sou igual para todos vós, e também vós sois todos iguais para mim. Não quero saber das vossas conversas, quero apenas que sejais amigos e trabalheis! Lançai um grão nos meus sulcos, eu dar-vos-ei cem. Espetai um raminho na terra, dar-vos-ei um plátano. Plantai um pomar, dar-vos-ei carradas de fruta. Criai gado, dar-vos-ei erva para ele. Construí casas, serei as paredes. Proliferai e multiplicai-vos, serei uma bela morada. Não tenho fim, não tenho limite, sou profunda e alta, chego e sobro para todos!” E perguntas-me tu se os homens podem viver sem guerras... Isso depende apenas de vós, da vossa vontade e do vosso bom senso, não de mim. - Revolta-me pensar, terra querida, que as guerras matam os teus melhores trabalhadores, os teus melhores mestres! Não posso aceitar tal. A vida convence-me de que os homens podem e devem opor-se à guerra. - Achas que as guerras não me fazem sofrer, Tolgonai? Fazem, e de que maneira! Tenho tantas saudades das mãos do camponês, e choro sem parar os meus filhos lavradores. Suvankul, Kassime, Djainak e todos os soldados que tombaram na guerra, fazem-me muita falta! Quando fico por arar, quando fico com searas por ceifar e trigo por debulhar, clamo por eles: “Onde estais, lavradores meus? Onde estais, semeadores meus? Levantai-vos, filhos meus, levantai-vos, lavradores, acudi-me que morro asfixiada!” Ah, como gostaria de ver chegar Suvankul com a enxada, Kassime com a ceifeira-debulhadora, Djainak com a carroça! Mas eles não me respondem... - Obrigada, terra, pelas tuas palavras. Portanto, também tu tens saudades dos meus homens, e choras por eles como eu os choro. Obrigada, terra.»
Tchinguiz Aitmatov, A Mãe Tolgonai

Sem comentários:

Enviar um comentário