segunda-feira, 28 de março de 2011

"Tanto aquilo que me escreves como o que oiço dizer de ti fazem-me ter boas esperanças a teu respeito: não viajas continuamente nem te deixas agitar por constantes deslocações. Um semelhante deambular é indício duma alma doente: eu, de facto, entendo que o primeiro sinal de um espírito bem formado consiste em ser capaz de parar e de coabitar consigo mesmo. Toma, porém, atenção, não vá essa tua leitura de inúmeros autores e de volumes de toda a espécie arrastar algo de indecisão e de instabilidade. Importa que te fixes em determinados pensadores, que te nutras das suas ideias, se na verdade queres que alguma coisa permaneça definitivamente no teu espírito. Estar em todo o lado é o mesmo que não estar em parte alguma! Ora a quem passa a vida em viagens acontece ter muitos conhecimentos fortuitos, mas nenhum amigo verdadeiro; o mesmo sucede logicamente àqueles que não se aplicam intimamente ao estudo de um pensador, mas sim percorrem todos de passagem e a correr. Um alimento que mal é ingerido imediatamente é "devolvido", não aproveita nem dá força ao corpo; igualmente nada prejudica tanto a saúde como a frequente mudança de medicamentos; uma ferida não cicatriza quando se lhe aplicam tentativamente diversos remédios; uma planta nunca se robustece se continuamente a mudamos de lugar; nada enfim, por muito útil, conserva a utilidade em contínua mudança. Demasiada abundância de livros é fonte de dispersão; assim, como não poderás ler tudo quanto possuis, contenta-te em possuir apenas o que possas ler."
Séneca, Cartas a Lucílio

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