sábado, 21 de janeiro de 2012

Ao fim da tarde, as ramblas estão coalhadas de forasteiros e de catalães que buscam em vão um lugar nas esplanadas. Nos lugares públicos sentam-se os operários e os doutores, as dactilógrafas e os aficionados taurinos, os capitalistas da seda e os curas de chapéu redondo e semblante amargo. Falam intimamente pessoas que ocupam cargos bem diversos, e uma rapariga com luvas transparentes sorri amigavelmente ao pequeno tecelão de calças de ganga que toma o seu gelado de café abanando-se com um prospecto de corrida. Não há a falsa respeitabilidade que faz dos portugueses tantas vezes escravos e conflituosos, mas uma franqueza, um génio de pundonor que impedem que a comunicação e a exteriorização humana se façam nivelamento grosseiro. Esta é uma virtude extraordinária do povo espanhol - esse contacto directo e nobre, sem familiaridade, e em que o aristocrata por qualidade do seu ser orgulhoso mas nunca pedante, não esquece que acima de tudo é homem. 
Agustina Bessa-Luís, Embaixada a Calígula

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