Percorro uma parte do castelo, subo as escadas moídas pelos passos de muitas gerações, olho a paisagem seca da Provença, tão hermética, pronta a mudar de rosto, a crispar os ares, a escurecer-se de roxos e azuis de aço. É uma paisagem inactiva e que não nos oferece nada de inesperado, excepto a própria vertente áspera e quase sinistra do Lubéron. Os seus verdes são agudos, sem essa penetração de humidade que veremos no vale do Pó ou que existe na nossa província do norte; quase estranhamos que os artistas prefiram a Provença para pintar e a elejam para viver, pois nós encontramos, naquela tranquilidade em que se suspende o vento, algo de vazio e contrário ao intelecto. É verdade que Gauguin não pôde suportar a Provença, ela opunha-se ao seu temperamento vinculado à acção como uma atmosfera de domingo, descansada na sua leve artificialidade. Mas em certos crepúsculos de Verão é inegável o seu encanto um tanto opressivo e em que reconhecemos o signo duma secreta violência em certas cores secas das montanhas, em certa luz que se extingue lentamente sobre os campos onde não passa ninguém.
Agustina Bessa-Luís, Embaixada a Calígula
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