Não me apetecia abrir os jornais que tinha comprado, nem destapar a água mineral que tinha junto de mim, nem bebê-la. De ambos os lados deslizavam terras de pasto e campos lavrados onde despontava o verde-pálido das plantações de Inverno, nascidas dentro do regulamento; parcelas arborizadas, valas com cascalho, campos de futebol, instalações fabris e as colónias, de ano para ano mais extensas, de habitações em banda e unifamiliares por trás das suas cancelas rústicas e sebes de ligustres, sempre de acordo com o plano. De repente, ao olhar para fora mais uma vez, incomodou-me perceber que não se via ninguém, embora nas estradas molhadas os carros passassem velozes, levantando um borrifo denso. Mesmo nas ruas das cidades havia mais automóveis do que pessoas. Na verdade, parece que a nossa espécie deu lugar a uma outra, ou, pelo menos, que vivemos em cativeiro. O mutismo dos meus companheiros de viagem e a minha própria imobilidade numa carruagem de expresso climatizada não eram propícios a dissipar tais conjecturas.
W. G. Sebald, Vertigens. Impressões
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