A memória
O senhor Henri estava
sentado no banco de jardim a pensar se o seu corpo se levantaria para
ir beber um copo de absinto.
O senhor Henri disse: a
minha alma já se levantou.
O senhor Henri olhou
depois para o corpo, tentando localizar o próprio rosto, mas não
conseguiu.
... há partes do meu
corpo que só posso ver com os meus olhos, e há outras que só posso
ver com a memória.
... é como se a memória
tivesse olhos, e mais antigos que os outros dois.
O senhor Henri depois
calou-se.
E o senhor Henri, depois
de um breve silêncio, disse: o certo é que a minha vontade já
bebeu um copo de absinto, e eu não.
... a minha vontade já se
encontra, neste momento, mais bêbada que eu.
... vou, pois, apanhá-la
- disse o senhor Henri.
O senhor Henri
levantou-se, então, do banco do jardim com um súbito movimento.
Eis finalmente uma
decisão. Ao absinto - gritou! E começou a andar rapidamente.
Gonçalo M. Tavares, O
Senhor Henri
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