Mesmo um homem de génio
traz em si uma medida que lhe permitirá chegar à conclusão de que
no mundo tudo anda para diante e para trás de uma forma
absolutamente inexplicável - mas, onde está esse homem? Ulrich não
sentia o menor desejo de se pôr a reflectir sobre isso, mas a
questão atraía-o sem que ele soubesse bem porquê.
- É preciso distinguir o
génio em geral do génio como superlativo individual - começou, sem
encontrar ainda a expressão mais certa. - Antes, eu pensava por
vezes que as únicas raças humanas importantes eram apenas a do
génio e a do estúpido, e que não é fácil misturá-las. Mas os
indivíduos da espécie genial, os geniais, não têm necessariamente
de ser logo génios. Este, o génio admirado, nasce verdadeiramente
na feira das vaidades; o seu brilho reflecte-se nos espelhos da
estupidez que o rodeia; ele está sempre dependente de qualquer coisa
que lhe confere mais algum mérito, como o dinheiro ou as
condecorações. Por maiores que sejam os seus méritos, apresenta-se
sempre como uma espécie de genialidade embalsamada ...
Agathe interrompeu-o,
curiosa por saber mais do outro: - Pois, mas ... e a genialidade
propriamente dita?
- Se retirares do boneco
empalhado o que é palha, o resto devia ser isso - disse Ulrich. Mas
pensou melhor e acrescentou, desconfiado: - Nunca saberei o que é
genial, e também não sei quem irá dizer-me o que isso é!
Robert
Musil, O
Homem sem Qualidades
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