domingo, 29 de setembro de 2013

Estou a ficar surpreendida com o seu conhecimento destas matérias, Vivi, olhei, li, senti, Que faz aí o ler, Lendo, fica-se a saber quase tudo, Eu também leio, Algo portanto saberás, Agora já não estou tão certa, Terás então de ler doutra maneira, Como, Não serve a mesma para todos, cada um inventa a sua, a que lhe for própria, há quem leve a vida inteira a ler sem nunca ter conseguido ir mais além da leitura, ficam pegados à página, não percebem que as palavras são apenas pedras postas a atravessar a corrente de um rio, se estão ali é para que possamos chegar à outra margem, a outra margem é que importa, A não ser, A não ser, quê, A não ser que esses tais rios não tenham duas margens, mas muitas, que cada pessoa que lê seja, ela, a sua própria margem, e que seja sua, e apenas sua, a margem a que terá de chegar, Bem observado, disse Cipriano Algor, mais uma vez fica demonstrado que não convém aos velhos discutir com as gerações novas, sempre acabam por perder, enfim, há que reconhecer que também aprendem alguma coisa (...).
José Saramago, A Caverna



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