terça-feira, 1 de abril de 2014

Quero somente dizer que o teu pai, como os impulsivos, dava a impressão de ter sobre a maioria das questões pontos de vista diversos, às vezes contraditórios, e que ele mesmo não conseguia coordenar. De que não conseguia, pelo menos, tirar uma certeza precisa, sólida, durável, directivas nitidamente orientadas. A sua personalidade, também, era composta de elementos heterogéneos, opostos e igualmente imperiosos-o que constituía a sua riqueza-mas entre os quais tinha dificuldade em fazer uma escolha, e de que jamais soube compor um todo harmonioso. Daí a sua eterna inquietação, e aquele mal-estar apaixonado em que sempre viveu.
É possível, aliás, que em graus variáveis, todos nós sejamos semelhantes a ele. Nós, quero dizer: os que nunca aderiram a um sistema já construído; os que-por não terem, em certo momento da sua evolução, adoptado uma filosofia precisa, uma religião, uma dessas plataformas estáveis, colocadas uma vez por todas fora de ataque, fora de discussão-estão condenados a fazer periodicamente a revisão dos seus pontos de apoio, e a improvisar equilíbrios sucessivos.
R. Martin du Gard, Os Thibault  

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